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Carlos A. M. FOSCOLO
Carlos@foscolo.biz
03-11-2012
ELEIÇÕES AMERICANAS: SÓ ELES VOTAM, MAS SOMOS TODOS AFETADOS
No próximo dia de 6/11 acontece um dos mais complicados processos eleitorais de um presidente de uma nação considerada protótipo de democracia: A eleição do presidente dos Estados Unidos da América. Mas por que estas eleições poderiam nos interessar? Em primeiro lugar, porque embora sejam os americanos que votam em seu presidente, dependendo de quem seja eleito, isso pode afetar diretamente todo o mundo. Para se ter uma idéia, de um telefone vermelho que fica ao lado de suas dependências na Casa Branca, a residência do presidente e também seu local de trabalho, ele tem poderes para ordenar a destruição do mundo.
Talvez um outro motivo para termos interesse em analisar as eleições e a política americana seja para vermos “como seríamos amanhã” ou, talvez, “como não gostaríamos de ser amanhã”. Isso porque, quer queiramos, ou não, a nossa democracia é uma cópia mal elaborada da democracia americana, que talvez não seja necessariamente a melhor, para isso bastando ver os métodos antiquados de sua eleição para a presidência da Nação.
Lembram-se quando no Brasil eclodiam os movimentos chamados de “Diretas Já”? É claro que a maioria não se lembra, pois isso foi principalmente nos anos de 1983-84. Pois bem, este movimento visava à restauração das eleições diretas para presidente da república porque se considerava que as eleições indiretas, feitas pelos deputados e senadores, representantes e eleitos pelo povo, “não eram democráticas”.
Pois bem. Já muito antes desta época, o país considerado o baluarte da democracia e de onde copiamos toda a nossa – os Estados Unidos da América – já elegiam o presidente da república de forma indireta, e de forma muito mais “anti-democrática” do que a nossa. Lá, desde as primeiras eleições constitucionais realizadas ainda no século XVIII, em 1789, quando os “eleitores” elegeram George Washington o primeiro presidente constitucional americano, o sistema era indireto, pois não havia o voto direto. Quem elegia eram os eleitores, mas não os votantes, Vale aqui ressaltar que antes de 1789, houve outros 14 presidentes que são chamados de “presidentes esquecidos” porque não foram eleitos pelas regras da Constituição, e sim pelo Congressp. Só depois da 12ª Emenda á Constituição passaram a ter também os “votantes”. Mas que confusão é esta? Vejamos rapidamente.
Tão logo após a Declaração de Independência, em 1776, das 13 colônias britânicas que passaram a formar uma federação (com poderes autônomos, o quê perdura até hoje) os chamados “pais fundadores da nação” dentre eles George Washington, Thomas Jefferson, Alexander Hamilton, John Adams, e outros, quase todos se tornaram presidentes constitucionais dos Estados Unidos.. Isso, não só pelo valor que realmente tiveram como idealistas fundadores da Nação Americana, mas, com certeza em virtude do sistema fechado de eleição que estabeleceram de só votar na eleição para presidente os eleitores escolhidos entre pessoas ilustres e de bem, e em número muito pequeno, e escolhidos de acordo com sua participação na vida política e social da nação, e certamente com alguma ligação com eles.
Pois bem, este sistema perdura até nossos dias. Assim, pois, no próximo dia 6 de novembro, cerca de 250 milhões de eleitores (alguns já começaram a votar há mais de um mês, tanto nos Estados Unidos como em várias partes do mundo) vãovotar para escolher entre o atual presidente Barak Obama e Mit Romney, quem será o próximo presidente. Mas não se iludam. Esta não é uma eleição direta. Ela é muito mais indireta do que aquela que em 1983 o povo brasileiro ia para as ruas pedir sua extinção por considerá-la anti-democrática, já que o presidente era eleito pelo Congresso Nacional. Pois bem, até hoje perduram nos Estados Unidos este mesmo sistema instituído no final do século XVIII e que facilita a manipulação de resultados.
Dentro do atual sistema eleitoral americano esta manipulação, de acordo com as conveniências, era tão comum, que vários presidentes foram eleitos sem que tivessem maioria de votos. O sistema que então vigorava era o do partido único, e o vice-presidente era o segundo colocado nas eleições. Pode-se muito bem imaginar as disputas e rivalidades. Houve até mesmo candidatos, ou políticos já eleitos, que assassinaram adversários. O sistema de eleitores escolhidos pelo próprio partido para eleger o presidente tornou mais fácil o controle de quem assumiria o poder.
E por falar em controle do poder, não é preciso ir muito longe para ver como o sistema americano de eleger o presidente é totalmente falho. Foi nas eleições de 2000 que George Bush (filho) concorreu à presidência com o então brilhante Al Gore (lançador da internet e líder na luta de controles ambientais) vice-presidente de Bill Clinton, um dos mais populares presidentes americanos. Ao final da eleição, não obstante ter Al Gore tido 50.996.582 votos contra 50.456.062 votos dados a Bush e ter vencido as eleições pelo, voto direto, com uma diferença de 540.520 votos, a vitória foi dada a Bush pela Suprema Corte, pois como os estados têm critérios diferentes para escolher e quantificar os eleitores – que não são os votantes – Bush teve 271votos no Colégio Eleitoral e Al Gore teve 266 votos. Não é necessário ser brilhante para ver como este sistema eleitoral é falho e inaceitável, principalmente para um país que é – ou pelo menos pleiteia ser – modelo de democracia para todo o mundo.
NOTAS
1) – Na próxima semana estaremos falando um pouco mais sobre as eleições americanas.
Achamos que o Furacão Sandy terá desempenhado um papel preponderante na possível vitória de Barak Obama nas eleições do próximo dia 6. Como as eleições estão tecnicamente empatadas, um fato novo superveniente, e a atitude dos agentes principais numa situação como esta pode ser decisiva. O fato de o Presidente ter abandonado a campanha (o que era previsto e foi estratégica e taticamente executado) durante a catástrofe, pode fazer uma grande diferença na avaliação de sua capacidade de liderança a ser avaliada pelos votantes. Assim, não teremos tempo para um outro artigo antes dos resultados provisórios. Mas arriscamos um palpite baseado em nossa análise: O presidente Barak Obama será reeleito por mais 4 anos, o quê agradará a nada menos que a população 173 países, tendo apenas uma contra: A do Paquistão.
2) Do amigo leitor José Valadares de Campos recebemos esta sua interessante narração, na qual ele referencia ao nosso escrito do último número desta coluna.
A JUSTIÇA DO REINO
Não sei por que, mas toda as vezes que penso nesse julgamento que está acontecendo no STF, lembro-me de uma história que li há muito tempo e que era, mais ou menos, assim:
— Um dia, o ladrão, que roubava para ganhar o pão – aqui, não se trata apenas de rima ou metáfora; nesta história falamos de um daqueles que realmente invadem as casas para roubar um pouco de pão, sem, contudo, querer dizer com isto que quem rouba para ganhar o pão merece cem anos de perdão –, ao tentar entrar num castelo através de uma janela que um serviçal deixou aberta, segurou numa tábua solta, caiu e fraturou a perna, ficando, por isso, incapacitado para se sustentar.
Passados os dias, faminto, o larápio procurou um advogado e entrou com uma ação indenizatória contra o castelão, que, intimado pelo ministro e conhecedor da justiça do reino, tratou logo de por a culpa num pedreiro: ele é que havia deixado atábua solta. Fora até solicitado a reparar o erro, mas não o fez.
Convocado a se justificar o pedreiro culpou uma moça, sua conhecida, dizendo que no momento em que estava assentando a janela teve sua atenção desviada pelo seu vestido que era muito curto e deixava à mostra suas belas pernas. A moça, perante o ministro, se disse inocente: era uma mulher séria! Normalmente não usava vestidos inadequados. Aquele, se ficou curto, foi por culpa do costureiro, que usou pouco tecido ou errou nas medidas.
Chamado ao tribunal o costureiro não apresentou uma justificativa convincente, foi declarado culpado, e por não ter o dinheiro para indenizar o ladrão, acabou condenado à morte. Seria enforcado daí a uma semana, durante as festas de aniversário do rei. E o ladrão, para não ficar desamparado, seria indenizado com dinheiro público. Para isto, elevaram-se os impostos.
Mas aí houve um pequeno contratempo: — o encarregado da construção da forca fez uma proposta a um dos fornecedores de madeira do reino, que para ganhar a licitação deveria dar-lhe dois dos seus melhores cavalos. Ganhou, mas para compensar a perda o homem mandou uma quantidade de madeira insuficiente, e o resultado foi que a forca ficou aquém da altura necessária, e como o costureiro era um homem alto, não foi possível enforcá-lo nela.
O ministro, que era um homem prático, determinou que encontrassem outro costureiro; um de menor estatura; — a sentença deveria ser cumprida na data determinada. Não encontraram. Ou melhor: até acharam um baixinho, quase anão, mas não era costureiro, ainda; era apenas aprendiz. Serve! Disse o ministro. Enforquem-no e acabemos logo com isto!... Mas a família do novo culpado era rica e influente: deu dinheiro aos jornais da época e estes fizeram uma campanha acusando o ministro de corrupto. (Há casos em que os jornais e revistas, ao contrário do que aconteceu nesta história, recebem dinheiro para bajular ministros para influenciar seus votos!)
Acuado pelas denúncias – dizem até que algumas eram verdadeiras – que os jornais estampavam todos os dias nas primeiras páginas, o representante real acabou mudando a sentença: o jovem aprendiz de costura apenas ficaria preso durante6 meses. Conformada, a família aceitou. Mas seus parentes exigiram que uma comissão o visitasse periodicamente como garantia de que não seria maltratado.
Na primeira visita os inspetores ficaram boquiabertos com o que viram: a cela era ampla, confortável, equipada com os melhores eletros-domésticos, possuía banheiro individual limpo e luxuoso. E ainda tinha dois serviçais para atenderem as tarefas de arrumação e limpeza, e também para servi-lo das melhores iguarias e bebidas. Cama macia e visitas íntimas a qualquer momento completavam o quadro. Depois da inspeção, e após comerem as melhores viandas regadas por excelente vinho, os membros da comissão foram ter com o ministro.
Um jornalista, que integrava o séquito fiscalizador, interrogou a autoridade sobre o inusitado conforto do preso: Aquilo era normal? Resposta do ministro: — Na verdade, não. Mas decidimos, e até foi o dono do seu jornal quem deu a sugestão, que a partir de agora todas as prisões do reino serão assim... afinal, este povo é um mistério e não sabemos como será o dia de amanhã!... História adaptada para homenagear Millôr Fernandes, um dos brasileiros mais cultos das últimas gerações. |